Em qual Mourão acreditar: no da campanha ou no de agora?
No dia 21 de janeiro, uma segunda-feira, Antonio Hamilton Mourão chegou bem-humorado ao Planalto para despachar como presidente da República. Com a viagem do titular a Davos, o vice assumiu interinamente. Era a primeira vez que um general estava no comando do governo desde 1985, quando Figueiredo deixou o cargo.
Mourão não fez por menos em seu rápido contato com os jornalistas: “Pessoal, bom dia. Só queria dizer o seguinte: extrema satisfação que o Flamengo venceu ontem e o Botafogo perdeu”.
Ao contrário de Bolsonaro e da trinca de filhos, que sistematicamente atacam a imprensa nas redes sociais, o vice se mostra simpático em tuítes de agradecimento ao “espírito profissional” da mídia. Os repórteres que cobrem Brasília retribuem chamando-o de “Mozão” na intimidade. E assim o general vai marcando seus golzinhos, no contra-ataque do que dizem o presidente e seus ministros.
Resta saber em qual Mourão acreditar. Se no da campanha eleitoral, defensor do autogolpe e da Constituição de notáveis, ou no de agora, que surpreende ao ficar ao lado de Jean Wyllys, descartar a possibilidade de intervenção na Venezuela, dizer que aborto é decisão da mulher e não considerar a flexibilização da posse de armas uma medida de combate à violência.
O estilo de Mourão, que usa linguagem e humor da caserna para rebater as posições de Bolsonaro, também pode ser visto como mais uma engrenagem diversionista, única tática política em que o novo governo tem se destacado até agora.
Em tempo: o general é um secador forte. Depois daquela declaração, o Botafogo perdeu para o Flamengo e faz uma campanha horrorosa no Campeonato Estadual. O curioso é que, entre os muitos clubes para os quais Bolsonaro diz torcer, um deles é o alvinegro carioca. Com o atual time de pernas de pau, não precisa nem secar, Mourão. (Álvaro Costa e Silva – Folha de S. Paulo)