Um vídeo divulgado a correligionários pelo presidente Jair Bolsonaro, por meio do WhatsApp, provocou críticas contundentes dos presidentes de outros dois poderes: o Supremo Tribunal Federal e a Câmara. O decano do Supremo, governadores e políticos de diferentes partidos também condenaram o ato. Bolsonaro reagiu às críticas dizendo que são ilações.
Depois das críticas do ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, ao Congresso, grupos de direita que apoiam o governo vêm convocando uma manifestação contra o Supremo Tribunal Federal e o Congresso, o que tem sido visto como ameaças a dois pilares do sistema democrático.
Na terça-feira (25), o presidente Bolsonaro usou sua conta pessoal no WhatsApp para divulgar a alguns correligionários a convocação da manifestação, sem citar o Supremo e o Congresso.
O ato provocou a reação do decano do Supremo, ministro Celso de Mello. Em nota, ele disse que:
“Essa gravíssima conclamação, se realmente confirmada, revela a face sombria de um presidente da República que desconhece o valor da ordem constitucional, que ignora o sentido fundamental da separação de poderes, que demonstra uma visão indigna de quem não está à altura do altíssimo cargo que exerce e cujo ato de inequívoca hostilidade aos demais poderes da República traduz gesto de ominoso desapreço e de inaceitável degradação do princípio democrático. O presidente da República, qualquer que ele seja, embora possa muito, não pode tudo, pois lhe é vedado, sob pena de incidir em crime de responsabilidade, transgredir a supremacia político-jurídica da Constituição e das leis da República”.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também criticou o presidente numa rede social:
“A ser verdade, como parece, que o próprio Pr tuitou convocando uma manifestação contra o Congresso (a democracia) estamos com uma crise institucional de consequências gravíssimas. Calar seria concordar. Melhor gritar enquanto se tem voz, mesmo no carnaval, com poucos ouvindo”.
Políticos dos partidos PSDB, Rede, PSOL, PSL, PDT, PCdoB, PSB, Cidadania, PT e MDB criticaram o presidente. Governadores de vários estados e vários partidos também se manifestaram e reforçaram a defesa da democracia. Partidos políticos, como PSDB, MDB e PSL, antigo partido do presidente Bolsonaro, divulgaram notas reforçando a importância das instituições democráticas e em defesa do Congresso.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, do Democratas, escreveu numa rede social que “criar tensão institucional não ajuda o país a evoluir. Somos nós, autoridades, que temos de dar o exemplo de respeito às instituições e à ordem constitucional. O Brasil precisa de paz e responsabilidade para progredir. Só a democracia é capaz de absorver sem violência as diferenças da sociedade e unir a nação pelo diálogo. Acima de tudo e de todos está o respeito às instituições democráticas”.
O presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, disse em nota que “sociedades livres e desenvolvidas nunca prescindiram de instituições sólidas para manter a sua integridade. Não existe democracia sem um Parlamento atuante, um Judiciário independente e um Executivo já legitimado pelo voto. O Brasil não pode conviver com um clima de disputa permanente. É preciso paz para construir o futuro. A convivência harmônica entre todos é o que constrói uma grande nação”.
Nesta quarta-feira (26), após as críticas, o presidente Bolsonaro foi às redes sociais e, sem desmentir a divulgação do vídeo, atribuiu as reações a tentativas de “tumultuar a República”.
“Tenho 35 milhões de seguidores em minhas mídias sociais (Facebook, Instagram, Youtube e Twitter), onde mantenho uma intensa agenda de notícias não divulgadas por parte da imprensa tradicional. Já no WhatsApp tenho algumas poucas dezenas de amigos onde, de forma reservada, trocamos mensagens de cunho pessoal. Qualquer ilação fora desse contexto são tentativas rasteiras de tumultuar a República”.
No meio da tarde, Bolsonaro chegou a Brasília. Ele estava no Guarujá onde foi passar o feriado do carnaval. Na entrada do Palácio da Alvorada, cumprimentou apoiadores, mas evitou a imprensa.
O vice-presidente Hamilton Mourão também falou em rede social: “Protestos fazem parte da democracia, que não precisa de pescadores de águas turvas para defendê-la. O presidente Jair Bolsonaro não atacou as instituições, que estão funcionando normalmente”.
O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, dom Joel Portella Amado, se manifestou nesta quarta num evento.
“Existe a corresponsabilidade de cada cidadão e existe a responsabilidade daqueles que, pelo voto, foram investidos. E, dentro disso, a democracia é condição indispensável para a preservação da vida em todas suas instâncias. A igreja estará apoiando as iniciativas que preservem a democracia. Qualquer outra, precisaremos ouvir, conhecer e até, quem sabe, interpelar”.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, também divulgou nota, dizendo:
“É grave, é inadmissível que o presidente da República use a força do cargo para convocar direta ou indiretamente atos que pretendam fragilizar a democracia, atacar as instituições. O presidente jurou, ao tomar posse, defender a Constituição e o estado democrático de direito. Tem obrigação de guardar o decoro do cargo. O presidente não pode criar constantemente, por suas falas e atitudes, elementos de estresse e de ruptura da democracia. Por isso, são essenciais a manifestação e o alerta de todos os democratas e da sociedade civil a fim de conter essas ameaças”.
Clique aqui para assistir ao vídeo.
(via JN)